O que aprendi ao estender roupa
Não me apetecia nada levantar-me do sofá. Estava mergulhada naquela letargia apática que nos prende sem darmos conta. Mas havia um motivo para o fazer: a roupa precisava de ser estendida.
Dirigi-me à máquina de lavar e abri o tambor. Quem já passou por isso sabe: lá dentro, a roupa parece ganhar vontade própria. Só sai quando quer. Umas peças libertam-se logo; outras ficam presas umas às outras, enroladas, como se se recusassem a abandonar o seu emaranhado confortável.
Comecei a retirar as peças e a transportá-las para o estendal. Mente dispersa, corpo ocupado. Aos poucos, o braço esquerdo ia ficando pesado com aquele amontoado de tecidos. Entre as peças, procurava em vão os lençóis — sempre o meu critério de começar pelas maiores peças primeiro. Foi nesse instante que parei.
Olhei para o braço carregado e, como num relâmpago, fez-se luz: não preciso de começar pelos lençóis. Posso estender primeiro as peças pequenas, libertar o braço, largar o peso. Ninguém me obriga a seguir o critério que sempre segui.
E nesse momento percebi: era exatamente o mesmo com a vida.
Nada nem ninguém me obriga a carregar tudo de uma só vez. Não tenho de ser perfeita, antecipar tudo, cumprir regras invisíveis que nunca questionei. Posso escolher. Posso largar. Posso até deixar de “estender a roupa que não é minha”.
Senti no mais profundo do meu Ser uma liberdade enorme. A rigidez com que olhava para as tarefas — todas igualmente urgentes, todas igualmente pesadas — deu lugar a um espaço novo: a possibilidade de escolher o que vem primeiro.
Sorri. Respirei fundo. E permiti-me estender cada peça que vinha à mão, sem pressa, sem regras.
Esta história é real. Aconteceu com um Ser maravilhoso com quem tenho o privilégio de trabalhar em psicoterapia. A ele deixo a minha Gratidão, por permitir que este momento de autodescoberta se torne inspiração também para ti.
Talvez hoje possa olhar para o que carrega nos braços e perguntar: qual é a peça mais pequena que posso largar primeiro?
M. Conceição Viterbo